quinta-feira, 21 de abril de 2022

Gregório de Matos, o Boca do Inferno, esquece a sátira no soneto barroco Buscando a Cristo

 Lídia Maria de Melo

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O poema barroco Buscando a Cristo, do escritor baiano Gregório de Matos, expõe o antagonismo entre a capacidade cristã de perdoar e a insignificância humana.  A ambivalência se apresenta também pela consciência do eu-lírico de ser um pecador que busca o acolhimento  do Cristo crucificado.

Em termos de estilo, o poeta apelidado de Boca do Inferno, devido às suas obras satíricas, emprega figuras de linguagem. Marcadamente, são observadas a antítese, ou seja, o uso de palavras e ideias de sentidos contrários, e a metonímia, em referência às partes do corpo de Cristo, braços, olhos, mãos, pés, cabeça, sangue, como se cada uma delas fosse de fato o corpo inteiro. 

Os cravos são mencionados como a representação do próprio castigo, a crucificação. Gregório de Matos utiliza ainda a prosopopeia ou personificação, atribuindo às partes do corpo de Cristo crucificado características humanas. 

Outra figura presente no poema é a zeugma, assim como a anáfora. Zeugma é a omissão da forma verbal “correndo vou”, que é empregada no primeiro verso da primeira estrofe e suprimida nas demais.  Anáfora é a repetição da expressão “ A vós” no início de vários versos.

Na estrofe  final do poema, o eu-lírico expõe sua necessidade de ser acolhido por Cristo e  o tamanho do sacrifício do filho de Nazaré pela humanidade. É nesse momento que podemos observar a característica denominada fusionismo, o homem entendendo que obterá incondicionalmente o perdão divino.

O barroco foi um movimento estético, surgido na segunda metade do século XVI, na Península Ibérica, após o Renascimento. Foi  marcado pelos princípios ideológicos nascidos  a partir da fundação da ordem religiosa Companhia de Jesus, em 1540, e ainda pelo movimento da Contra-Reforma, que se caracterizou pela tentativa de conciliar as novidades renascentistas  com a tradição religiosa da Idade Média. 

Além disso, o barroco sofreu influência das decisões do Concílio de Trento, que se reuniu de 1545 a 1563, que teve como principal objetivo reafirmar os dogmas católicos diante do crescimento do  protestantismo.

Nessa época, surge então, um novo homem, com pensamentos, concepções sociais, políticas, artísticas e religiosas, influenciadas pela Contra-Reforma católica e pelos ditames do Concílio de Trento.

Entre as características barrocas, estão: o culto ao contraste, como se vê no poema Buscando a Cristo, de Gregório de Matos; uma preferência pelos aspectos cruéis, dolorosos, sangrentos e até repugnantes, com o intuito de mostrar a miséria humana por meio de impressões sensoriais; o conflito entre o homem santo e o homem pecador; uma intensidade na exposição do sentido da existência humana; a humanização do sobrenatural; e o fusionismo, ou seja, a fusão entre luz e treva, entre racional e irracional, surgindo  daí o uso abusivo das figuras de linguagem nas obras literárias.

O barroco, como citou Domício Proença Filho, em Estilos de Época na Literatura, apresenta “traços bem definidos nas artes visuais e plásticas, bem como na literatura” , que correspondem ao século XVII. Ele está na raiz do futuro movimento do Romantismo e penetra pelo século XVIII, um período de entrecruzamento ideológico.

Independentemente das características estéticas do poema Buscando a Cristo, a leitura dessa obra na Semana Santa nos remete à crucificação de Jesus pelos romanos e a seu mais profundo ensinamento: amar ao próximo como a si mesmo.


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